Para milhares de pacientes em estado vegetativo, o "leitor da mente" é a esperança de que algum dia eles possam voltar a se comunicar.
G1
Uma descoberta científica revolucionária: pela primeira vez um cientista provou que pacientes em estado vegetativo têm atividade consciente em seus cérebros. E, mais impressionante ainda, o cientista conseguiu se comunicar com esses pacientes.
Acidentes terríveis. Ferimentos devastadores. Sequelas que deixam pessoas presas para sempre dentro de corpos que não podem controlar. E famílias que não sabem se o que falam é ouvido.
Alex hoje tem19 anos. Há um ano e meio ele voltava de uma festa com amigos. A mãe conta que, quando percebeu que tinha perdido a parada em que devia descer, o filho pulou do ônibus ainda em movimento.
A 40 quilômetros por hora, ele não conseguiu se equilibrar e bateu a cabeça no asfalto.
Desde então, Alex está assim em estado vegetativo. Não anda, não se alimenta sozinho e não consegue mais se comunicar com ninguém.
Scott vive essa situação há mais de dez anos. Ele ia pro trabalho quando, ao atravessar a rua, foi atropelado por um carro de polícia.
“Foi catastrófico”, disse Anne, mãe de Scott.
A ciência começa agora a encontrar um caminho para ajudar casos como esses.
Se os cientistas conseguissem decifrar o que acontece no cérebro desses pacientes, eles poderiam ser libertados desse mundo de silêncio. Seria como usar um leitor da mente.
A resposta para isso pode estar no trabalho de um neurocientista, no Reino Unido, Adrian Owen. Ele procura os mais remotos traços de consciência em pacientes vegetativos. Foi ele quem desenvolveu o "leitor da mente".
“Nós usamos a ressonância magnética para tentar encontrar alguma atividade consciente nesses pacientes. Nós pedimos para ele pensar em algo específico e tentamos detectar qual é a parte do cérebro que é ativada quando ele pensa nessa coisa”, explicou Owen.
Uma característica incrível do cérebro é que, quando você imagina que está fazendo uma atividade, você usa as mesmas partes do cérebro que são acionadas quando realmente realiza aquilo.
A ressonância mostra em vermelho as áreas que estão trabalhando mais intensamente, recebendo mais sangue e oxigênio.
Muitas pessoas confundem o estado de coma com o estado vegetativo.
“As pessoas perguntam "como está o seu filho?" ele está dormindo. "mas ele reconhece vocês?" eu não sei. "ele conversa?" não. E eu respondo isso umas 10 ou 15 vezes por dia”, contou Sally, mãe de Alex.
“O estado de coma é uma condição em que o indivíduo não acorda e permanece de olhos fechados. O estado vegetativo é uma condição em que ele continua inconsciente mas ele abre os olhos sem ajuda de aparelhos. E a morte cerebral é uma condição em que para se manter vivo ele precisa da ajuda de aparelhos”, afirmou Roberto Oliveira, Instituto D´Or de pesquisa.
Alex é o caso típico de um paciente em estado vegetativo. Jess é a namorada dele.
“Às vezes ele acorda por dez minutos e depois dorme mais três horas. Eu tento ficar conversando com ele o tempo todo. Espero que ele reconheça a gente”, revelou Jess.
A família quer saber também se ele sente dor. Paciente vegetativo tem reflexo muscular. Quando o médico alonga o braço dele, a reação parece ser de dor. Reações assim podem ser um indício de que no fundo de um cérebro tão machucado ainda existe consciência.
Segundo os pais de Scott, ele às vezes chega a se comunicar por sinais.
“Ele usa os olhos e os polegares para dizer sim ou não”, disse Anne, mãe De Scott.
Mas o médico não acredita que Scott consiga se comunicar dessa forma.
“Sou médico dele há dez anos e, infelizmente, nunca vi nenhuma evidência de resposta consciente nele”, contou Brian Young.
Alex e Scott são levados para participar da pesquisa do professor Owen.
“Scott, eu quero que você tente o máximo possível imaginar que está jogando tênis. Quando eu disser "imagine", você deve pensar que está acertando uma bolinha com uma raquete”, ressaltou Owen.
É um desafio enorme para pacientes com lesões tão graves no cérebro. Eles precisam ouvir, lembrar, interpretar - funções normais de uma mente consciente e saudável.
“Ok, Scott. Vamos começar. Imagine que você está jogando tênis. Nós temos atividade bem ali”, disse Owen.
Algo fantástico acontece. Apesar do diagnóstico médico, que afirmava que Scott não tinha um cérebro funcional, ele responde ao comando do professor Owen. Segundo o neurologista, ele pensa exatamente naquilo que é pedido.
A vida de uma família inteira pode mudar num único instante. Esse é Steven. Ele estava dirigindo, quando perdeu o controle do carro e acertou um poste.
“Ele ficou em coma profundo por três meses e meio. Então, abriu os olhos. Mas nunca mais conversou ou fez um gesto consciente”, lembrou John, pai do Steven.
Exatamente como Scott, a atividade cerebral de Steven combina perfeitamente com o comando da equipe médica.
“É muito emocionante”, disse Owen.
Steven tem algum nível de consciência. Mas poderia ir além? Responder alguma pergunta simples?
A equipe do professor Owen quer saber se Steven sabe que tem uma sobrinha, que nasceu três anos depois do acidente.
“Imagine que você está jogando tênis para responder "sim". E a pergunta é: a sua irmã, jen, tem uma filha? Muito bom, fantástico! Ele está com uma ótima atividade cerebral. Realmente tentando responder a pergunta. A gente provou que ele poderia ter memória de coisas que aconteceram depois do acidente”, afirmou Owen.
Quando perguntado sobre a sobrinha, Steven claramente pensou no jogo de tênis. Querendo dizer "sim", que a irmã tinha uma filha.
Agora é a vez de Scott.
“Scott, você está sentindo alguma dor? Você sente dor?”, questionou Owen.
Se a resposta for "sim", Scott precisa imaginar que está caminhando por uma casa. Se for "não", ele deve pensar que está jogando tênis.
“Nós estamos vendo atividade na mesma área usada quando ele pensa que está jogando tênis. É um alívio”, contou Owen.
Ele não está sentindo dor.
“De longe esse é o resultado mais importante que alcançamos. Agora nós vamos poder saber coisas que melhoram a vida dos pacientes. Vamos poder perguntar se eles gostam do que estão vendo na TV. Vão poder decidir a que horas querem tomar banho ou comer. Isso é qualidade de vida”, ressaltou Owen.
“ Do ponto de vista da família isso já traz um certo alento no sentido de que aquele familiar que está lá ou visitando ou indo lá conversar poderia saber: Olha, ele realmente está ouvindo, ele realmente está ouvindo as minhas palavras, Pode parecer pouco, mas pra cabeça de muitas pessoas isso vai ser muito”, afirmou Jorge Moll Neto, neurocientista do Instituto D´Or de Pesquisa.
Apenas uma parte dos casos vai poder se beneficiar desta nova técnica.
“Aproximadamente 9% a 10% desses indivíduos em estado vegetativo eles são capazes de estabelecer comunicação inteligível com o meio ambiente”, destacou Roberto.
Alex já está em casa. Contra todas as perspectivas, ele tem consciência em alguns momentos.
Para ele e para milhares de paciente em estado vegetativo o "leitor da mente" é a esperança de que algum dia eles possam voltar a se comunicar.
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