sexta-feira, 12 de junho de 2015

"A vida sobre 4 rodas": Deputada Federal Mara Gabrilli concede entrevista ao Cenário MS


A primeira deputada tetraplégica da história nacional fala de suas conquistas e de suas lutas por um país melhor para todos

Foto: Reprodução Facebook

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Mara Gabrilli é militante pelas causas dos portadores de deficiência física


por ALINE ALVES COSTA
Redação
A psicóloga, publicitária, colunista, escritora e Deputada Federal pelo PSDB: Mara Gabrilli, é a primeira deputada tetraplégica da história da política nacional.


Mara sofreu um acidente de automóvel, em 1994, que a deixou tetraplégica. Passou cinco meses internada, sem se mexer do pescoço para baixo, sem poder falar, comunicando-se apenas pelo piscar de olhos e respirando com o auxílio de um respirador artificial – e a partir de então, teve uma nova companheira: a cadeira de rodas.


Perante à tal situação, Mara pensou: "OK! Eu sobrevivi, mas eu não quero continuar assim!". E a sua luta passou a ser, literalmente, de cabeça erguida, sendo-lhe a única parte do corpo capaz de se mexer.


Então em 1997, Mara Gabrilli fundou o Instituto Mara Gabrilli, onde desenvolve programas de defesa às pessoas portadoras de deficiência física e em 2004 iniciou sua carreira política como vereadora na Câmara Municipal de São Paulo e atualmente exerce o seu segundo mandato como Deputada Federal.


Mara Gabrilli concedeu entrevista via online ao site Cenário MS para a série de reportagens especiais "A vida sobre 04 rodas", confira:






CMS: Deputada Mara Gabrilli, a sua deficiência física contribuiu para a sua entrada para a política ou já fazia parte de seus ideais?

Mara Gabrilli: Eu não diria que entrei para a política pela minha deficiência, mas sim graças à minha vontade de transformar. Nunca tive a pretensão, desejo ou vontade de entrar para a política. Na verdade, nunca me imaginei na vida política. Logo depois que sofri o acidente que me deixou tetraplégica, em 1994, passei alguns meses em reabilitação nos Estados Unidos. Após o acidente, comecei a retomar minha vida cotidiana. A maior dificuldade foi encarar a deficiência da cidade. Vi que muitas pessoas sofriam com a falta de acesso dos lugares. Além de acesso, faltava informação, faltava muita coisa. Percebi que já não fazia sentido trabalhar apenas com alguma coisa que me trouxesse dinheiro. Após me recuperar, terminei a faculdade de psicologia e fundei uma organização, o Instituto Mara Gabrilli, que apoiava o paradesporto e pesquisas científicas. Mesmo sem saber, comecei a fazer política ainda naquela época. Mas a entrada para a vida política foi em 2004. À frente da ONG me sentia de mãos amarradas para mudar muita coisa que era preciso para melhorar a vida de pessoas com deficiência na cidade, como reformar as calçadas, por exemplo. Convencida pela minha mãe, decidi me candidatar a vereadora em São Paulo. De lá para cá, fui secretária municipal da pessoa com deficiência em São Paulo, vereadora paulistana e atualmente estou no meu segundo mandato como deputada federal.




Mara Gabrilli na tribuna da Câmara dos Deputados (Foto: Reprodução Facebook)



A sua maneira de fazer política tem uma tônica especial que é a preocupação e melhoria da condição de vida das ‘minorias’, essa peculiaridade deve-se à que?

Costumo dizer que tive a “sorte” de quebrar o pescoço depois de fazer duas faculdades. A educação da pessoa com deficiência ainda é um grande gargalo, seja pela falta de escolas adaptadas, seja pela falta de materiais didáticos acessíveis, seja pela pouca quantidade de professores capacitados para ensinar pessoas com diferentes formas de aprender. Além disso, tive a oportunidade de ter uma reabilitação de qualidade, coisa que a maioria dos brasileiros com deficiência não tem. Apesar de termos centros de reabilitação de excelência, como a Rede Lucy Montoro, do governo do Estado de São Paulo, de uma forma geral a reabilitação no Brasil ainda é miserável. Por isso, senti a necessidade de aproveitar as oportunidades que a vida me deu e trabalhar para melhorar a vida de quem não teve essas mesmas oportunidades. É isso para isso que venho me empenhando desde então.





Como é possível, no seu caso, conciliar a limitação física ao destemor em desenvolver uma eficiente política?

Acima de tudo, preciso ter saúde para dar conta das atividades do meu dia a dia. Para meu corpo aguentar as viagens semanais a Brasília e o ritmo do Congresso, onde atualmente também acumulo o cargo de terceira secretária da Câmara, reservo duas horas diárias para me exercitar. Ao meu lado, tenho sempre uma assistente para me auxiliar em todas as tarefas. Para votar, utilizo um sistema desenvolvido pela Câmara, que me permite registar o voto apenas com o movimento do rosto. Ou seja, no meu dia a dia, utilizo recursos de acessibilidade, adaptações e tecnologia assistiva que me permitem realizar todas as tarefas. E isso vai de acordo com a convenção da ONU sobre os direitos das pessoas com deficiência, segunda a qual quem realmente tem deficiência são as cidades, que não foram preparadas para receber todo o tipo de pessoa. Quando eliminamos as barreiras e equiparamos as condições, é a própria deficiência que diminui. Isso também tem a ver com a ideia do Desenho Universal, um conceito que tem por objetivo definir produtos e ambientes contemplando a diversidade humana: desde as crianças, adultos altos e baixos, anões, idosos, gestantes, pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. Afinal, um ambiente que receba qualquer tipo de pessoa, não segrega e contribui para a inclusão. Ainda que você não tenha uma deficiência, um dia ficará idoso e precisará de um ambiente acessível. Por que então não criarmos espaços e serviços que atendam a todos?





Mara utilizando bandagem no braço e na perna - Técnica Kinisio Taping (Foto: Reprodução Facebook)







"Quando eliminamos as barreiras e

equiparamos as condições, é a

própria deficiência que diminui.

Isso também tem a ver com a ideia do Desenho Universal,

um conceito que tem por objetivo definir produtos e ambientes"










E o que atualmente é assegurado por lei aos portadores de deficiência física no Brasil?

A legislação brasileira nessa área é muito vasta e uma das mais completas do mundo. Garante não só às pessoas com deficiência física, mas à todas as pessoas com deficiência, condições de igualdade aos demais cidadãos em diversos setores da sociedade. O grande problema é que falta fiscalização para garantir que essa legislação seja cumprida.




Qual a próxima conquista?

No início de março conseguimos aprovar, na Câmara dos Deputados, a Lei Brasileira da Inclusão da Pessoa com Deficiência, da qual tive a honra de ser relatora e redigir um texto bastante completo e democrático, construído com toda a sociedade. Esse projeto modifica legislações já existentes e cria novos direitos, em diversas áreas: educação, assistência social, comunicação, cultura, lazer, trabalho, previdência social, mobilidade, habitação, tributária, até mesmo direitos civis e combate ao preconceito. O projeto de lei retornou ao Senado Federal, e o Senador Romário foi designado como relator. Esperamos que esse projeto seja votado em breve e, em seguida, sancionado pela presidente Dilma.










Mara Gabrilli, primeira deputada tetraplégica eleita (Foto: Reprodução Facebook)




Além da limitação física, há u

ma deficiência ainda maior em nosso país que é a questão da “Acessibilidade” e a falta de respeito com as vagas destinadas aos cadeirantes, bem como, a outros portadores de deficiência física. Nesse caso, o que se fazer?

Um ponto importante sobre essa questão são as vagas reservadas em estabelecimentos privados de uso público, como é o caso de shoppings, supermercados, bancos e farmácias, por exemplo. Coloquei na Lei Brasileira da Inclusão um artigo que altera o Código de Trânsito, permitindo que essas vagas possam ser fiscalizadas pelos órgãos competentes para autuar nesses locais. Mas esse é um problema diretamente relacionado à educação e conscientização da população sobre a importância de se respeitar essas vagas. Nesse sentido, falta investimento público em campanhas destinada a esse fim.




Há alguns dias foi publicado em sua rede social um episódio que sofreu por falta de acessibilidade em um aeroporto. Em Bataguassu os cadeirantes sofrem da mesma dificuldade com o transporte coletivo, isso significa dizer que os cadeirantes daqui enfrentam a mesma condição de dificuldade com acessibilidade que a Deputada?

Infelizmente, a realidade não é boa para todos os brasileiros. Essa não foi a primeira vez que tive problemas com a falta de acessibilidade para viajar, e constantemente recebo relatos sobre dificuldades enfrentadas por passageiros com deficiência. De acordo com a legislação toda a rede de transportes do país já deveria ser acessível. O prazo de dez anos para que isso acontecesse, definido pelo Decreto 5.294/94, expirou em dezembro do ano passado. E isso inclui todos os ônibus, trens, terminais, paradas, portos... Mas, infelizmente, como podemos constatar todos os dias, isso ainda não aconteceu.



Deputada Mara Gabrilli, o site Cenário MS sente-se honrado em entrevistá-la e a parabeniza pela sua garra e a diferente política que tem feito por nosso país e concede esse espaço a Vossa Excelência, para suas considerações finais...

Primeiramente, gostaria de agradecer o convite do Cenário MS. Costumo dizer que sou um exemplo prático de que sozinhos não chegamos a lugar algum. Durante toda minha trajetória política pude contar com o apoio de pessoas que acreditam na política do bem, para melhorar a vida de pessoas. Meus projetos são baseados nas necessidades e demandas que recebo da população. Continuem cobrando, opinando e sugerindo, pois conto com vocês, por meio de suas ideias e sugestões, para construirmos um Brasil com mais acessos.



Mara Gabrilli em pé em cadeira adaptável ( Foto: Reprodução Facebook)

Contatos:

Facebook: Mara Gabrilli




Site: www.maragabrilli.com.br




E-mail: maragabrilli@maragabrilli.com.br

http://www.cenarioms.com.br/noticias/2692/-A-Vida-sobre-4-rodas----Entrevista-com-Mara-Gabrilli--1--Deputada-Tetraplegica-do-Brasil.html






*** Em razão de sua limitação física, o texto da entrevista foi redigido por Ricardo Vendramel, assessor da Deputada Federal Mara Gabrilli - PSDB.