sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Publicidade inclusiva desafia marcas a experiências sensoriais

O último censo do IBGE, divulgado em 2010, revela que 23,9% da população brasileira têm pelo menos uma das deficiências aferidas pela pesquisa: visual, auditiva, motora e mental ou intelectual. A deficiência visual é a que registra maior ocorrência, afetando 18,6% da população brasileira. Em segundo lugar está a deficiência motora, ocorrendo em 7% da população, seguidas da deficiência auditiva, em 5,10% e da deficiência mental ou intelectual, em 1,40%.
Só entre 2001 e 2006 o aumento da participação dessa parcela da população no mercado de trabalho aumentou 5.000%. Ou seja: é um público ativo, que participa consideravelmente do mercado e, a cada geração, é possível observar a ascensão progressiva dos seus rendimentos. Ao total, são quase 46 milhões de brasileiros que estão na cadeia de consumo, mas que têm necessidades diferentes para receber a informação. Você já pensou o que sua marca tem feito para se comunicar com esta fatia importante do público?

Mapear e transformá-los em target

RPC - Publicidade Inclusiva - Fhabyo Matesick
Fhabyo Matesick: está na hora de desmembrar e entender o perfil deste público
Não é raro que estes consumidores se sintam negligenciados pelo mercado devido às falhas no processo de contato, que raras vezes se adéquam às suas necessidades. Fhabyo Matesick, diretor de planejamento da agência de propaganda Tif, em Curitiba, explica que o principal fator limitador é a ausência de informações sobre estes targets, como eles se comportam e o que esperam dos processos de comunicação. “Quantas pessoas da audiência de cada meio são portadoras de deficiências? Quais canais eles usam mais para buscar informação? Nunca vi institutos de pesquisa desmembrarem o perfil do público dessa forma. Está mais do que na hora de mapearmos e realmente pontuá-los dentro do processo”, explica.
Para Matesick, é crucial que a publicidade tenha conhecimentossobre os processos de consumo deste público para atuar de forma inclusiva. “Em 12 anos de agência, nunca tive a oportunidade de participar da concepção de uma campanha que também estivesse preparada para falar com pessoas com deficiência. Sem dados, não conseguiremos fazer da publicidade um espaço de inclusão”, acredita.

Marketing sensorial e tecnologias assistivas

Quando se fala em publicidade inclusiva é até comum imaginá-la separada da publicidade “tradicional”. Mas as duas podem e devem ser trabalhadas em conjunto: já pensou em incluir no ponto de venda, nas revistas informativas e em outros espaços de comunicação offline a comunicação com o público deficiente visual usando o sistema braille?
Em fevereiro deste ano, a empresa de telecomunicações TIM anunciou o desenvolvimento do plug-in “emodi sounds”, que permitem a usuários cegos ouvirem com emoção os emojis enviados em conversas
Em fevereiro deste ano, a empresa de telecomunicações TIM anunciou o desenvolvimento do plug-in “emoji sounds”, que permitem a usuários cegos ouvirem com emoção os emojis enviados em conversas







Em 2014, uma concessionária da Volkswagen no Brasil resolveu associar-se ao movimento rosa com uma campanha que leva as mulheres a apalparem de fato o papel. Foi distribuído junto com um jornal impresso uma espécie de flyer interativo que associa o toque com os dedos do auto-exame às mamas com a leitura em braille
No meio televisivo, o closed caption ainda é uma das soluções pioneiras de inclusão aos deficientes auditivos, pois permite que este público acompanhe a programação da telinha com a ajuda de audiodescrição. No universo online, a experiência dos usuários com deficiência já conta com imensa variedade de recursos facilitadores, como aplicativos que podem ser programados para funcionar junto aos sites e fazer a leitura para deficientes visuais.  Essas e outras ferramentas, como braille ou até mesmo a rampa para o cadeirante, são chamadas de tecnologias assistivas: são recursos que facilitam o dia a dia das pessoas com deficiência e atendem às suas diferentes necessidades. Na comunicação publicitária, há ainda muito campo para inovação.
RPC - Publicidade Inclusiva - Lak Lobato
Sons que Lak escutou depois que voltou a ouvir e que marcaram sua vida: chiado da latinha de refrigerante abrindo, o primeiro “eu te amo” do esposo e o barulho do vento
Lakshmi Lobato é publicitária e perdeu a audição aos dez anos. Aos 32 anos, por meio de cirurgia de implante coclear, voltou a ouvir. Mas nestes 22 anos, Lak se adaptou à surdez e fez tudo o que sonhou: graduação, aprendeu francês, casou, viajou. Já trabalhou em agências como Leo Burnett Tailor Made e Fabrica, de São Paulo.
“A base da comunicação na propagandaquase sempre é visual, porém, a importância do diálogo e dos sons ambientes faz com que você realmente compreenda a mensagem. Tente assistir os comerciais sem o áudio e entender perfeitamente o que estão vendendo, qual o apelo, o que motiva o consumidor a comprar. Nem sempre é compreensível. Às vezes, sequer dá para saber o que estão vendendo”, afirma Lak.  A solução pode ser criar uma legenda descritiva especial para deficientes auditivos quando a campanha for à telinha. “Além do diálogo, este tipo de legenda descreve os sons que compõem o cenário, uma campainha, passos suspeitos, cachorro latindo, fundo musical de suspense”, explica.
Quando bem feita, conta Lobato, mesmo que seja veiculada por sistema fechado (closed caption) já ajuda a traduzir perfeitamente a propaganda. “Já no caso dos surdos que não têm domínio no português, a janela de intérprete de LIBRAS é necessária”, avalia.

Primeiras impressões depois que voltou a ouvir

Depois que voltou a ouvir, Lak conta que a primeira propaganda que a marcou foi a da VIVO, que narrava a história da música Eduardo e Mônica, da banda Legião Urbana. “Meu marido estava no computador e eu ouvi um som familiar. Não cheguei a reconhecer claramente, mas algo em mim me fez pular na cadeira e perguntar: “Que som é esse?”.
Ao descobrir de qual música se tratava, Lak foi atrás da agência que produziu a campanha e contou sua história. “O diretor de arte da propaganda comentou no meu blog pessoal que tinha ficado emocionado. Eu até ganhei um poster autografado pelos músicos da banda. Foi uma surpresa incrível, porque eu nunca imaginaria que uma propaganda pudesse me afetar tanto e respingar tanto em quem fez a propaganda, o fato dela ter me afetado”, conta.
Deu pra entender por que é fundamental que as marcas repensem a forma com que se comunicam junto ao público? Vamos juntos pensar em uma publicidade mais inclusiva!

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