terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Lute pela igualdade sempre que a diferença nos inferioriza...

Lute pela igualdade sempre que a diferença nos inferioriza, mas lute pela diferença sempre que a igualdade nos descaracteriza"
Boaventura
Num dia desses, no supermercado aqui perto de casa, encontrei um rapaz fazendo compras. O adolescente, devia ter uns 15 ou 16 anos, andava pelas gôndolas, olhava alguns produtos e colocava alguns no seu carrinho. Nada muito diferente do que qualquer um faz, exceto o fato que o menino tinha síndrome de Down o que, por motivos mais que óbvios, me chamou a atenção.

Como não é o único jovem que já vi no meu bairro fazendo suas atividades de forma independente (sempre vejo um outro, mais velho, caminhando sozinho na rua) fiquei feliz com sua liberdade. Me enganei. Não demorou muito para que surgisse a mãe com outros produtos e colocasse junto com os outros. De qualquer forma, o rapaz, em momento algum, demonstrou alguma dificuldade em ajudar nas compras.

Cruzei com os dois em outras gôndolas e, quase simultaneamente, em direção à fila do caixa. O supermercado não estava lotado, mas também não tinha caixas livres. A mãe não teve dúvidas, foi direto para o caixa preferencial, ou seja, seu filho era suficientemente capaz para ajudar a fazer as compras mas, para escapar da fila, ele virava um "deficiente".

Nesse momento me vieram à cabeça duas frases. A do professor português Boaventura Santos (que uso como epígrafe) e a da propaganda de uma marca de cigarros protagonizada pelo futebolista Gérson onde ele dizia que era preciso levar vantagem em tudo.

Frequentemente tenho visto cenas e lido relatos exatamente iguais a esses. Pessoas com deficiência ou pais de pessoas com deficiência que, debaixo do discurso de igualdade e de inclusão não perdem nenhuma oportunidade de levar vantagem em tudo.

Pessoas com capacidade econômica atrás de benefícios fiscais, pessoas que querem viajar a turismo caçando descontos beneficentes em passagens aéreas, pessoas sem nenhum problema de mobilidade furando filas.

Agem como se a afirmação de Boaventura fosse: devemos lutar pela igualdade quando ela nos convém e lutar pela diferença quando ela nos convém.

Os mais furiosos vão me responder dizendo que, se a lei permite, porque não aproveitar? Por que não levar vantangem em tudo, certo?

Errado. Cada vez que alguma pessoa usa sua deficiência como arma para obter vantagens ela reforça a percepção deficitária que o resto do mundo tem. Ela proclama para todos que as pessoas com deficiência precisam de tratamento diferenciado por que nunca alcançarão a autonomia. Reforça o discurso da exclusão.

As pessoas com deficiência precisam de respeito e respeito é algo que se conquista, não cai do céu.

Não podem nem se deixar vencer por imposição de condições absurdas (o artigo da Mara Gabrilli sobre esse tema é um bom exemplo disso) mas, também, não podem ser, elas mesmas, a abusadoras.

Claro, tudo é uma questão de bom senso que, infelizmente, é um produto em falta no mercado.
http://xiitadainclusao.blogspot.com.br/2010/04/o-gerson-de-cada-um.html
 

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