http://www1.folha.uol.com.br/colunas/redesocial/2017/03/1868085-retrato-da-inclusao-criancas-com-down-estrelam-ensaio-fotografico.shtml
Eles têm entre oito meses e cinco anos de idade e foram convidados a
posar para as lentes da fotógrafa Gislaine Schebeliski pelo mesmo
motivo: são crianças especiais.
As dez foram selecionadas para um ensaio comemorativo ao 21 de Março,
Dia Internacional da Síndrome de Down. Uma data que tem por objetivo
justamente dar visibilidade às questões relacionadas aos portadores de
uma alteração genética no cromossomo 21.
As fotos que ilustram este texto são uma importante ferramenta de
inclusão, na visão da profissional especializada em focar suas lentes
para recém-nascidos, gestantes e famílias.
Desde 2013, ela faz também um trabalho voluntário com crianças especiais.
"A foto tem essa capacidade de gerar impacto, dispensa palavras e quebra
preconceitos", diz a fotógrafa de 38 anos. "Meu objetivo é fazer com
que as estas crianças sejam vistas como iguais em sua essência. As
pessoas precisam enxergar cada uma com suas diferenças e respeitá-las."
Para mirar em pessoas com deficiências –crianças com Down, paralisia
cerebral, autismo e outras síndromes, Gislaine se matriculou em um curso
de especialização na Special Kids Photography Brasil.
O braço brasileiro da iniciativa foi fundado pelo fotógrafo Rubens
Vieira, com o objetivo de capacitar profissionais locais para trabalhar
na inclusão social deste público tantas vezes condenado à
invisibilidade.
A organização nasceu nos Estados Unidos a partir do relato de uma mãe
que esbarrou em várias negativas ao tentar fazer um ensaio fotográfico
profissional do filho de um ano, que tinha uma deficiência congênita.
As dificuldades daquela mãe calou fundo na brasileira, que passou a
frequentar workshops de capacitação dados por Vieira, profissional que
assinou os ensaios do longa "Colegas", que narra a história de três
jovens com síndrome de Down.
"Mexeu muito comigo a história daquela mãe americana que se viu diante
da recusa de fotógrafos que alegavam não saber lidar com uma criança
especial. Por puro preconceito, eles não viam beleza nela. Isso partiu
meu coração", relata Gislaine.
Ela então se questionou: "Quantas mães no Brasil não devem passar por
essas experiências frustrantes? Quantas famílias especiais gostariam de
ter fotos profissionais dos seus filhos?"
Decidiu fazer uma especialização para conhecer aquele universo
específico, com seus ritmos e particularidades. "Eu não tinha nenhum
envolvimento com crianças especiais antes", relata Gislaine, mãe de
Miguel, 6.
Depois de um ano, veio a certificação, referendada com três ensaios
fotográficos, nos quais retratou três garotos, um com Down, outro albino
e um com a síndrome de Leshc Nyhan.
O novo ensaio, agora em estúdio na Vila Leopoldina, zona oeste de São
Paulo, foi realizado na semana passada, com cinco meninos e cinco
meninas, todos com Down.
"O fato de ser credenciada dá segurança aos pais de que estou habilitada
para fotografar uma criança especial. Eu me profissionalizei nisso",
explica.
O resultado são imagens delicadas e nas quais os modelos parecem à
vontade e felizes. "Os ensaios giram em torno de 30 minutos para não
cansar a criançada. Ela já chegam e te abraçam, chamam de tia. São muito
amorosas."
CONFRATERNIZAÇÃO
Além do trabalho voluntário como fotógrafa, Gislaine deu um passo além
ao criar o grupo Retratos Especiais em uma rede social para interagir
com famílias e crianças portadoras de algum tipo de deficiência. "É um
grupo fechado, que funciona como um canal para comunicação."
O contato com os pais levou ao primeiro encontro presencial, em 2014, no
parque Villa-Lobos. "Enquanto as crianças ficam brincando com os
amiguinhos na recreação, eu as fotografo", explica Gislaine, que é
também administradora do grupo na internet, que já conta com 282 mães
participantes.
"Os encontros têm como principal objetivo promover a troca de
experiências e compartilhar informações entre as famílias. Neles, temos
profissionais qualificados interagindo com os pais, como psicólogas,
educadoras."
Além de registrar os momentos de lazer e confraternização, a fotógrafa
compartilha as melhores imagens gratuitamente para os familiares.
O trabalho voluntário prevê a escolha de uma criança por mês para ser
clicada no estúdio, sem custo. A seleção é feita dentro do grupo fechado
exclusivo do Retratos Especiais.
"Tenho como objetivo combater o preconceito por meio das imagens e
escrever uma nova história social, além de dar a oportunidade às
famílias especiais de ter uma fotografia profissional e de qualidade dos
seus filhos. Uma lembrança para o resto da vida", afirma a fotógrafa.
Cliques que revelam bem mais do que sorrisos. "Toda criança tem seu
encanto: no sorriso, no olhar, na timidez, na ternura... Basta sabermos
enxergar. Só precisamos dar a elas a oportunidad
e
de se mostrar, de sair do casulo. É isso que tento captar, a essência
de cada uma delas com um cromossomo a mais ou a menos, não importa."